Olhar para um homem não é o mesmo que olhar para um objeto – basta uma simples percepção para entender que uma cadeira não desperta o interesse em saber sua história; basta-nos a sua função, a causa final de Aristóteles, o seu “quê” específico, em suma, a sua presença revela o que se é, e isso é suficiente. Com o homem, no entanto, parece não ser possível realizar o mesmo processo investigativo, porque ele traz consigo um tipo de peso, uma densidade única e irrepetível que dificulta a redução feita com a cadeira. Ser homem, ao que parece, não se resume ao material, mas às virtualidades inerentes ao modo de ser humano, ou seja: o homem não é apenas o aqui e o agora, no presente – mas tudo o que ele foi e tudo que será – , pois é também virtualização e, por efeito, movimento. [1] MARSILI, 2018, itálico nosso
Reconhecendo o tamanho do homem como infinitamente maior que o meio – ao qual ele se manifesta, o corpo -, dá-se a impressão de não haver nada estável na constituição humana, nenhum elemento fixo que sirva de referência diante das constantes mudanças que fazem parte do ato de ser homem – o corpo, mesmo “finalizado”, sofre mudanças visíveis, transformações. É neste contexto que entra o temperamento, o “tempero” que faz parte de cada um – um tipo de filtro com características próprias que recebe e devolve as impressões do mundo de modo muito particular. “O temperamento não é só uma realidade corporal, nem afetiva, nem psíquica. Ele é como um chão onde se apoiam as nossas outras faculdades; é uma marca que temos, um filtro através do qual passam os elementos tanto do mundo interior quanto exterior”. [2] MARSILI, 2018, p. 27, itálico nosso
Segundo LAHAYE (2008), no entanto, os temperamentos podem ser quantificados até certo ponto, existindo algumas características, demarcadas claramente, que são positivas e negativas em cada um deles:
Tabela 1 – Quadro com as características de cada temperamento
TEMPERAMENTO | QUALIDADES | DEFEITOS |
SANGUÍNEO | Comunicativo, eminente, entusiasta, afável, simpático, bom companheiro, compreensivo, crédulo | Pusilânime, volúvel, indisciplinado, impulsivo, inseguro, egocêntrico, barulhento, exagerado, medroso |
COLÉRICO | Enérgico, resoluto, independente, otimista, prático, eficiente, decidido, líder, audacioso | Irascível, sarcástico, impaciente, prepotente, intolerante, vaidoso, autossuficiente, insensível, astucioso |
MELANCÓLICO | Habilidoso, minucioso, sensível, perfeccionista, esteta, idealista, leal, dedicado | Egoísta, mal-humorado, pessimista, teórico, confuso, antissocial, crítico, vingativo, inflexível |
FLEUMÁTICO | Calmo, tranquilo, responsável, eficiente, conservador, prático, líder, diplomático, bem-humorado | Calculista, temeroso, indeciso, contemplativo, desconfiado, pretensioso, introvertido, desmotivado |
Seu método para abordar os temperamentos é baseado na classificação por porcentagem. Dessa forma, o homem possui todos os quatro temperamentos dentro de si, assim como os humores de Hipócrates, aos quais podem agir sobre o indivíduo, causando mudanças no seu comportamento. Assim, um indivíduo pode ser 40% melancólico, 30% colérico, 20% sanguíneo e 10% fleumático; também é possível um equilíbrio, ou seja: 50% fleumático e 50% melancólico. Quanto mais predominante for uma característica no indivíduo, mais fácil, segundo LaHaye, identificar o temperamento. Porém, caso as características de dois ou mais temperamentos possuírem forças semelhantes ou aproximadas, mais difícil será a identificação. LaHaye segue a linha dos temperamentos mistos. Um ponto ao qual ele chama a atenção é a distinção entre temperamento, caráter e personalidade – em que ele separa-os por níveis. [3] LAHAYE, 1967
“O temperamento é a combinação de características congênitas que subconscientemente afetam o procedimento do indivíduo. Essas características são coordenadas geneticamente com base na nacionalidade, raça, sexo e outros fatores hereditários. Essas características são transmitidas pelos genes. Alguns psicólogos chegam a insinuar que herdamos mais genes dos nossos avós do que dos nossos pais. Esta seria a causa de algumas crianças se parecerem mais com os avós do que com os genitores. A formação das características do temperamento é tão imprevisível quanto a cor dos olhos, dos cabelos, ou da dimensão do corpo.
O caráter é o verdadeiro eu. […] É o resultado do temperamento natural burilado pela disciplina e educação recebidas na infância, pelos comportamentos básicos, crenças, princípios e motivações.
A personalidade é o semblante externo de nós mesmos, que pode ser ou não igual ao nosso caráter, dependendo de quão autêntico sejamos.
Frequentemente, a nossa personalidade é uma fachada agradável para um caráter desprezível ou medíocre. Muitas pessoas, hoje em dia, representam um papel, baseando a sua atuação naquilo que presumem que um indivíduo deva ser, e não no que elas realmente são.
Em resumo, o temperamento é a combinação de características com as quais nascemos; o caráter é o nosso temperamento “civilizado”; e a personalidade é o “rosto” que mostramos ao próximo“. [4] LAHAYE, 2008, p. 14-15, itálico nosso