A proposta desse trabalho é metafísico-platônico, o que será discutido aqui é a filosofia da linguagem wittgensteintiana, partindo de um dos trabalhos mais proeminentes do século XX: o Tractatus Logico-Philosophicus, bem como das filosofias de Olavo de Carvalho, Mário Ferreira dos Santos e Herman Dooyeweerd. Como os três autores apareceram aqui? Porque, como o professor Olavo de Carvalho desenvolveu (no que chamou dialética da absorção), temos o dever de absorver não só os autores clássicos, mas grandes autores modernos, tomando posse do autor em diálogo interno (crítica transcendental dooyewweerdiana) e antítese (crítica interna).
Além disso, o trabalho fenomenológico de Olavo é o que mais me impacta, cito alguns: círculo de latência, conhecimento por presença, da contemplação amorosa, as doze camadas da personalidade, teoria dos quatro discursos. Meu objetivo com Olavo de Carvalho é platonizar a fenomenologia do professor nos meandros da filosofia quadrante. Já o nosso maior filósofo, Mário Ferreira dos Santos, auxilia-nos a (re)interpretar sentenças do Tractatus para além da (linguagem) lógica subjacente (que estrutura o mundo).
Tomo como base, a teoria da sistência (o prefixado e suas prefixações ontológicas) de Ontologia e Cosmologia, a decadialética de Lógica e Dialética, as teses meontológicas de Filosofia Concreta e A Sabedoria do Ser e do Nada, década sagrada (as leis eternas) de A sabedoria das Leis Eternas e conceitos importantes como fatores emergentes-predisponentes, intensidade-extensidade e as tensões. Do filósofo holandês Herman Dooyeweerd, recorro à sua ontologia dos aspectos modais desenvolvida em sua magna obra A new critique of theoretical thought. Conceitos importantes como retrocipação-antecipação, substrato-superestrato, momentos modais analógicos, tempo cósmico. Tudo que está escrito nos meus comentários do tractatus logico-philosophicus, ora ou outra, considerará esses três grandes filósofos.
1§ SENTENÇA UM: o mundo é tudo o que ocorre [1] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus. São Paulo: Editora da USP, 1968, p.55.
O mundo, onde tudo ocorre, é o mundo dos fatos ônticos. É o mundo objetal inquestionável in re. É a presença real de tudo que há, como postulou Mário Ferreira dos Santos: “Alguma coisa há”. [2] SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia Concreta. São Paulo: Editora Filocalia, 2020, p.26. O Tractatus logico-philosophicus se inicia levantando uma holística arquimédica – é a alavanca wittgensteintiana:

O mundo ôntico referencial, o qual usamos a norma linguística (Dooyeweerd) [3] Aspecto modal que aparece na ontologia geral do filósofo holandês Herman Dooyeweerd. – com signos-significados que figura-se, é acatamentativo [4] Teoria do acatamento é uma ideia metafísica desenvolvida por mim, no livro A teoria do acatamento: ato-formativo e potência materiável. : registramos formas (morphê prote) ônticas vestindo determinadas matérias (hilê deutera) – isso é o que ocorre. Não há mundo sem linguagem para nos referir a tal. Essa referenciação é o figurar – com sentido. Se não figura-se, não há sentido, não havendo sentido, perde-se todo o isomorfismo [5] Isomorfismo significa “da mesma forma”. entre o Segundo e Terceiro princípio quadrante. [6]Princípios axiomáticos que diz respeito a consciência intencional do eu-unal-noesis (segundo princípio) e realidade-noemático-cognoscível (terceiro princípio). Seguindo o professor e filósofo … Continue reading
Tudo que ocorre; acontece enquanto totalidade-particulares – o um e o múltiplo. O mundo é ocorrência dinâmica sistente, o mundo onde tudo ocorre é fração temporal – passado, presente e futuro triádico é pura ilusão (Mctaggart) afigurativa (Wittgenstein). [7]Discuto esse tema do tempo, considerando Dooyeweerd, Santo Agostinho, Mário Ferreira dos Santos, Olavo de Carvalho e Régis Jolivet, no meu livro Filosofia quadrante – Tomo II. Lá, apresento o … Continue reading Seguindo os passos de McTaggart [8]MCTAGGART, J. L. The Unreality of Time. Disponível em: https://philpapers.org/archive/MCTTUO.pdf A nossa percepção do tempo triádico (passado-presente-futuro) é ideal-ilusório. O que figura … Continue reading (irrealidade do tempo), o tempo triádico não figura sentido; o que há, figurando-se no mundo dos fatos ocorrencionais, é o que chamo de fração agórica. Não há presente, passado ou futuro.
O que há é a fração agórica – um já rápido ocorrencional dado [9]A minha ontologia quadrante especulativa inicia com a seguinte primícia ontológica: Tudo é Dado em regulação. Você pode conferir os dez mandatários da filosofia quadrante no meu canal de … Continue reading numa regulação com sentido. Impossível escaparmos desse primeiro postulado wittgensteintiano. Apesar do primeiro Wittgenstein pedir-me para me calar – ouso traí-lo – implico, para desespero dos amantes do primeiro Wittgenstein, levar suas sentenças tratadistas ao campo metafísico ôntico-ontológico. Como me ensinou o professor e filósofo Olavo de Carvalho, tentando transcender o diálogo e antítese de Abraham Kuyper e Herman Dooyeweerd, há uma dialética da absorção.
Olavo concorda com Herman Dooyewerd no que diz respeito à síntese de motivos-bases não cristãos com o cristão (criação-queda-redenção), mas tenta superar o filósofo da Ideia Cosmonômica, dizendo- nos:
“Onde não é possível uma dialética hegeliana, antítese e síntese), é possível uma dialética de absorção. A dialética de absorção já é conhecida muito antes do cristianismo. Você a observa no hinduísmo onde as várias realidades que se apresentam são em seguida relativizadas como ilusórias ou parcialmente ilusórias e integradas numa realidade superior. Quer dizer, essa realidade superior não é um terceiro ele- mento, não é uma síntese no sentido hegeliano, ela é a própria tese que absorve a antítese, mostrando que ela não tinha uma existência de direito próprio”. [10] CARVALHO, Olavo de. Curso Online de Filosofia. 25 Jul. 2015, aula 300.
2§ SENTENÇA: o mundo é a totalidade dos fatos, não das coisas [11] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
Wittgenstein traz uma diferenciação emergencial. Para o filósofo, existe uma diferença entre fato e coisa. Fato é a ocorrência ou a ocorrência é factual, coisa é abstração – um nome, uma nominação. O que é fato? A factualidade é o que Thomas Reid chamou de realismo de senso comum. O fato é a base de todas as proposições formais, validade formal silogística sem a verdade do fato é masturbação mental reducionista. Retomando o Thomas Reid, a filosofia não pode destruir a crença natural na existência de um mundo exterior. [12] REID, Thomas. An Inquiry into the Human Mind. Jonathan Bennett, 2017. Veja que o filósofo Wittgenstein usa o termo no plural, o mundo que ocorre possui factuais, o múltiplo-relativo e imperfeito, que nos informa Platão.
Os fatos que ocorrem são múltiplos e imperfeitos. O uso de signos com seus significados é sempre no acontecer real. Wittgenstein dá voz à reação do eu-outro na realidade através da linguagem limitacional: os limites da minha linguagem são os limites da minha circunstância mundanial-factuais. Portanto, só podemos falar (reação da autonomia linguística sobre o mundo dos fatos) da coisidade porque há multiplicidade de fatos ocorrendo.
3§ SENTENÇA: o mundo é determinado pelos fatos e por isto consistir em todos os fatos [13] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
A realidade, segundo Wittgenstein, é determinada pela factualidade de suas ocorrências dinâmicas; essa determinação factual é consistente, tomando o conceito de consistência à luz de Mário Ferreira dos Santos. A sistência é prefixada, segundo Mário Ferreira dos Santos, ou seja, o que é fato determinado o é enquanto istemi, mas, como tudo que é determinado e prefixado na factualidade, o é dinamizando-se; o fato é esse aí-sendo, o qual usamos a linguagem para fazer referência ao que está-aí-sendo; por isso, a consistência do ocorrer factual é tensional; consiste numa relação do tender de dentro para fora.
Toda sentença, seja ela ordinária ou científica, passa pelo filtro da linguagem limitacional. O limite da minha linguagem é o limite do mundo. O limite do mundo não é porque o mundo é limitado pelo signo-significado, mas porque minha reação autônoma linguística não pode alcançar a profundidade dos fatos- referenciais determinados – só o Primeiro Princípio quadrante tudo esgota. Não há filosofia, ciências e vida ordinária sem a ocultamentalização, porque, como disse Mário Ferreira dos Santos, conhecer é desconhecer. [14]“Campo das oposições da Intuição: conhecimento e desconhecimento. Já estudamos os conceitos da razão e da intuição e a conceituação oposta. A intuição, como conhecimento do singular, … Continue reading
Voltando ao tema ferreiriano, se os fatos ônticos, para Wittgenstein, ocorrem, essas ocorrências sis-tentiza-se. Essa sistentização [15] SANTOS, Mário Ferreira dos. Ontologia e cosmologia: a ciência do ser e a ciência do cosmo. 2. ed. São Paulo: Editora Logos, 1957, p. 27. acontece porque o mundo é tudo o que ocorre prefixantemente. [16] Ibidem. Logo, o prefixo “con” nos indica que a prefixação é determinada, ou seja, o fato é consistente é “coerência e coesão”. [17] Ibidem., p.88. Por isso, os fatos ônticos que ocorrem assumem forma fora aparente, essa forma acatamental geometrizada vestindo determinada matéria é forma- fora mantida, persistindo. Os fatos ocorrencionais perduram, é a linguagem limitacional não alcança toda sublimidade desses fatos, logo, entendo que linguagem é resistência porque o referente é resistente, isso indica a junção eu- mundo; estamos juntos, resistimos juntos. Mas o fato do mundo ôntico acatamentado noematicamente pelo meu eu-intelectivo terecionalizado capta, pela linguagem limitacional no fato, influências externas e internas que modificam formas ônticas acatamentais.
4§ SENTENÇA: a totalidade dos fatos determina, pois, o que ocorre e também tudo que não ocorre [18] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
Se há o ocorrer dos fatos determinados em totalidade tonais múltiplas, deverá de ter seu contrário; sua anti-nomicidade. Logo, temos o não ocorrer dos fatos mundanos. Tudo que ocorre, também não ocorre. A totalidade homogênea e suas multiplicidades heterogêneas também é um não ocorrer. O ocorrer é o acontecer sucessitivo, o não ocorrer é o não acontecer. Isso indica ausências de… – o nada relativo. O que é o nada relativo? Aqui, o filósofo e mestre Mário Ferreira dos Santos nos ajuda a entender melhor o tema da não ocorrência wittgensteintiana.
Em Filosofia Concreta, o Exodia [19]Mário F. dos Santos é o grande Exodia da filosofia, aquele grande, como disse o professor Olavo, que pode se assentar à mesa com Platão e Aristóteles como um igual. Ir até o nosso maior … Continue reading da filosofia brasileira traz-nos quatro características do nada. Dois positivos, os outros dois negativos: 1. Nihilum (negativo) 2. To kenon (negativo) 3. Nada relativo (positivo) 4. Meon (positivo). A despeito disso, o nada relativo positivo e concreto é a ausência de alguma coisa determinada aí- sendo no horizonte dos fatos. Se alguma coisa há, se algo deve haver, alguma coisa não há; alguma coisa não deve haver. Segundo Ferreira dos Santos, ausência de alguma coisa determinada positiva-se por referência concreta.
O nada relativo está ao lado de tudo que é finito. Sempre faltará algo em alguma coisa, nenhum ser-ôntico concreto perfectibiliza-se na ordem fracionada agórica – caso isso acontecesse, teríamos de acabar com os conceitos de potência aristotélica, tímese parabólica ferreiriana, círculo de latência carvalhiana, isto é, toda essa riqueza teria de ser destruída. Como próprio Mário Ferreira dos Santos apontou: “[…] porque, ao lado desse ser, pode-se apontar o que ainda não é […], o que lhe ausenta”. [20] SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia Concreta. São Paulo: Editora Filocalia, 2020, p. 354. Se Wittgenstein está certo, e tudo que é factual ocorre e, antinomicamente, não ocorre; o não ocorrer é figurado no mundo ôntico, ou seja, o não ocorrer é uma ausência. Aqui, Wittgenstein e Mário Ferreira dos Santos coadunam-se.
5§ SENTENÇA: os fatos, no espaço lógico, são o mundo [21] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
Os fatos estão todos no espaço. Mas o que é o espaço? O conceito, oriundo do latim spatium, significa “extensão”. Herman Dooyeweerd defendeu que o espaço é uma lei ontológica inquebrável, e seu núcleo de sentido é a “extensão contínua”. Wittgenstein recorre a uma analogia antecipante-consequente na modalidade aspectual lógica. [22] Tomo a lógica, enquanto aspecto modal, com implicação da ontologia filosófica de Herman Dooyeweerd. O espaço lógico epistêmico é onde não há ambivalências, é onde a estrutura do mundo factual é desvelada. Lógica, como defendo, é agnoiologal [23] Agnoia significa ignorância. Não uma ignorância pré-teórica, a agnoialogia equivale a douta ignorância de Nicolau de Cusa. e epistêmica – enquanto arte ou ciência do raciocínio correto na validade intensa post rem e verdade extensa in re.
O professor Olavo de Carvalho [24]O professor Olavo disse: “Estudar lógica não torna ninguém mais inteligente. O que funciona é treinar o “instinto lógico” no uso da linguagem diária. Instinto lógico é o senso da … Continue reading, como filósofo do registro ôntico, filósofo da presença do ser, que conhecemos, considerou que devemos ter um instinto lógico –, buscando não só um raciocínio válido formalmente, mas a verdade in re. Esse instinto lógico deve considerar os fatos ônticos com uma linguagem lógica pré-teórica agnoia imaginativa. [25]No meu livro (Ensaios teofilosóficos machadianos – Vol. 1), eu construí uma teoria carvalhiana que a batizei das doze letraduras principiais. A partir de Olavo, considero que só podemos dominar … Continue reading É dessa dimensão que partimos para analisarmos a estrutura do mundo por uma linguagem lógica atualizante [26]Todas as ciências, por possuir um discurso dialético (os outros discursos estão virtualmente latentes), são passíveis de serem atualizadas. Nenhuma ciência pode arrogar para si apoditicidade. … Continue reading (recortes científicos) e complementarizante [27]A filosofia assume um discurso analítico-apodítico. Todas as captações filosóficas são complementos no grande castelo filosófico. Em filosofia, não se atualizam verdades apodíticas, o que … Continue reading (universalidade filosófica).
Portanto, a lógica subjacente não é proposições e proposições elementares, e sim a agnoia pré-teórica enquanto realismo do senso comum. Mas entendo que a lógica não pode ser dominada por nenhuma ciência ou filosofia, a lógica ou linguagem lógica é autônoma em sua própria esfera de soberania. Ela, a linguagem lógica formal, é o ferramental raciocinativo para todos que fazem ciência (partes de um todo) ou filosofia (o todo onde estão as partes).
6§ SENTENÇA: o mundo se resolve em fatos [28] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
Essa sentença wittgensteintiana remete a um ponto aristotélico; segundo o estagirita, o mundo dos fatos independe do eu-outro. [29] O eu-outro são axiomas da filosofia quadrante. Há diálogo intenso com o Martin Buber. Logo, Wittgenstein acerta ao dizer que a mundanidade é resolvida em fatos. Sem os fatos, nada pode ser resolvido. Sabemos que o que vem primeiro é a mundanidade, só depois usamos os jogos de linguagem (segundo Wittgenstein) para referenciar algo que há – aí-sendo fracionado – agoricamente. O conceito resolver, do latim resolvere, remete ao que desata.
O mundo dos fatos está desatado de todas as nossas imposições. Tente esgotar todos os acidentes de um qualquer ôntico sistente, impossível. Apesar de nos ajudar, o mundo não se resolve com ciência e filosofia, o mundo se resolve por si próprio. É muito soberba acharmos que damos sentido a tudo que existe. Somos todos limitados. Inclusive, a linguagem lógica é limitada. Nihil est absolutum. O terceiro princípio quadrante se resolve em seus próprios fatos predisponentes in re. [30] O conceito predisponente foi desenvolvido pelo filósofo Mário Ferreira dos Santos.
7§ SENTENÇA: algo pode ocorrer ou não ocorrer e todo o resto permanecer na mesma [31] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
O que ocorre é sempre uma fração temporal agórica. O que não ocorre é uma ausência no ocorrer factual. Tudo que ocorre não ocorre, o ser possui graus de não-ser-relativo. Fora disso, nada mais há: tudo é uma permanente factual ocorrente e não-ocorrente.
8§ SENTENÇA: o que ocorre, o fato, é o subsistir dos estados de coisas [32] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
Voltando ao Mário Ferreira dos Santos, a sistência prefixada dos fatos determinados possui uma prefixação acontecional no prefixado istemi. O subsistir das ocorrências mundana, quadrantemente, subsiste com superioridade de estados para além do ratio. Filosofar acaba sendo uma ação de submissão.
9§ SENTENÇA: o estado de coisas é uma ligação de objetos (coisas) [33] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
O mundo real, esses fatos noemáticos, é um amontoado de objetos ligados. Aqui temos o um que não é só um, também são multiplicidades ônticas. Tudo que ocorre factualmente, ocorre na onticidade-sistente, é tripartição do ser de múltiplos seres que visionamos. Não podemos aplicar os entes de razão à teoria da tripartição do ser. A aplicabilidade da tripartição do ser é somente no que acatamentamos, de forma terecional, ônticamente.
10§ SENTENÇA: é essencial para a coisa poder ser parte constituinte de um estado de coisas [34] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55.
A ligação dos ônticos múltiplos da sentença nove denota, segundo Wittgenstein, uma essência. Para a coisidade poder ser, tripartidicamente, um constituinte; os estados de coisas possuem múltiplos predicativos. Todos os predicativos estão ligados nos estados coisais.
11§ SENTENÇA: nada é acidental na lógica (se uma coisa puder aparecer num estado de coisas, a possibilidade do estado de coisas já deve estar antecipada nela) [35] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.56.
Na linguagem lógica, nada é por acaso. Tudo que aparecer aí-sendo na vida ordinária, aparece com a necessidade de ser depurada pela lógica subjacente. Uma vida com alta cultura é uma vida que precisa de raízes lógicas.
12§ SENTENÇA: parece, por assim dizer, acidental que á coisa, que poderia subsistir sozinha e para si, viesse ajustar-se em seguida uma situação. Se as coisas podem aparecer em estados de coisas, então isto deve estar nelas (algo lógico não pode ser meramente possível. A lógica trata de cada possibilidade e todas as possibilidades são fatos que lhe pertencem). Assim como não podemos pensar objetos espaciais fora do espaço, os temporais fora do tempo, assim não podemos pensar nenhum objeto fora da possibilidade de sua ligação com outros. Se posso pensar o objeto ligando-o ao estado de coisas, não posso então pensá-lo fora da possibilidade dessa ligação. [36] WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.56.
A linguagem lógica epistêmica lida com todas as possibilidades captáveis do mundo ôntico ordinário. O que pensamos, logicamente, pensamos junto com as coisidades de factuais. Tudo que existe, ex-siste como ligamentos. O objeto que vejo faz parte de um estado de coisas múltiplas com prefixações no istemi – eis a ligação entre o objeto (sistente) e seu acontecer (pre-fixações no prefixado). Fora disso, é niilismo, absurdismo. Sem essa sentença wittgensteintiana, resta tentar dar algum tipo de positividade ao nada absoluto, coisa que é lógico, ôntico e ontologicamente impossível.
References
| ↑1 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus. São Paulo: Editora da USP, 1968, p.55. |
|---|---|
| ↑2 | SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia Concreta. São Paulo: Editora Filocalia, 2020, p.26. |
| ↑3 | Aspecto modal que aparece na ontologia geral do filósofo holandês Herman Dooyeweerd. |
| ↑4 | Teoria do acatamento é uma ideia metafísica desenvolvida por mim, no livro A teoria do acatamento: ato-formativo e potência materiável. |
| ↑5 | Isomorfismo significa “da mesma forma”. |
| ↑6 | Princípios axiomáticos que diz respeito a consciência intencional do eu-unal-noesis (segundo princípio) e realidade-noemático-cognoscível (terceiro princípio). Seguindo o professor e filósofo Olavo de Carvalho, temos, no primeiro, o reino do conhecer, no segundo o reino do ser. |
| ↑7 | Discuto esse tema do tempo, considerando Dooyeweerd, Santo Agostinho, Mário Ferreira dos Santos, Olavo de Carvalho e Régis Jolivet, no meu livro Filosofia quadrante – Tomo II. Lá, apresento o tema do presente-éon. Fora da fração agórica, temos o presente-éon num eterno agora sem deixar-de-ser ou o ser-aí-sendo (dasein-sosein). Um ponto: apresento esse conceito (fração agórica) pela primeira vez aqui. |
| ↑8 | MCTAGGART, J. L. The Unreality of Time. Disponível em: https://philpapers.org/archive/MCTTUO.pdf A nossa percepção do tempo triádico (passado-presente-futuro) é ideal-ilusório. O que figura sentido na realidade dos fatos ocorrentes, ou seja, o que possui referência nos estados de coisas objetais é a fração agórica. Fração diz respeito ao agorismo. Fração deriva do latim frationis, do verbo frangere. É a reação da autonomia relativa de quebrar. A todo momento estamos quebrando o agora. O conceito presente é vago. |
| ↑9 | A minha ontologia quadrante especulativa inicia com a seguinte primícia ontológica: Tudo é Dado em regulação. Você pode conferir os dez mandatários da filosofia quadrante no meu canal de YouTube. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4Qde8QTx1Mk&list=PLYgBgC_Iwf bictixxmxtxBkq_h1g01kQf&index=1. |
| ↑10 | CARVALHO, Olavo de. Curso Online de Filosofia. 25 Jul. 2015, aula 300. |
| ↑11 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55. |
| ↑12 | REID, Thomas. An Inquiry into the Human Mind. Jonathan Bennett, 2017. |
| ↑13 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55. |
| ↑14 | “Campo das oposições da Intuição: conhecimento e desconhecimento. Já estudamos os conceitos da razão e da intuição e a conceituação oposta. A intuição, como conhecimento do singular, portanto do diferente, do heterogêneo, é um conhecimento e também um desconhecimento. Não conhecemos todo o conteúdo de uma singularidade. Mas nessa seleção entram outros campos. E o mesmo que aplicamos à razão, aplica-se à intuição. Se conhecemos este livro como um exemplar (como singularidade), e apreendemos sua cor vermelha, as manchas que lhe são próprias, únicas, exclusivas, o papel, este, que o compõe, em tudo isso não conhecemos tudo, mas desconhecemos também, porque conhecer algo é desconhecer também algo, como ter atenção para algo é desatender tudo o mais” (SANTOS, Mário Ferreira dos. Lógica e dialética. 4. ed. São Paulo: Editora Logos, 1959, p. 247, grifos nossos.). |
| ↑15 | SANTOS, Mário Ferreira dos. Ontologia e cosmologia: a ciência do ser e a ciência do cosmo. 2. ed. São Paulo: Editora Logos, 1957, p. 27. |
| ↑16 | Ibidem. |
| ↑17 | Ibidem., p.88. |
| ↑18 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55. |
| ↑19 | Mário F. dos Santos é o grande Exodia da filosofia, aquele grande, como disse o professor Olavo, que pode se assentar à mesa com Platão e Aristóteles como um igual. Ir até o nosso maior filósofo é como escalar o monte Everest, sem preparo e cuidado, perecemos na escalada dessa grande montanha concreta e suprema. Mário é um pandemônio, um assustador, um proibido, uma monstruosidade filosófica. Leigos devem se afastar – não encoste. Muitos que vão ao grande, desistem no meio do caminho. Parafraseando Karl Barth, ao se referir a João Calvino, eu digo: Mário Ferreira dos Santos é uma catarata… falta-me completamente os recursos, as ventosas, até mesmo para assimilar esse fenômeno positivo e concreto, isso para não falar sobre a sua apresentação satisfatória. O que recebo é somente um pequeno e tênue jorro e o que posso dar em retorno, então, é apenas uma porção ainda menor desse pequeno jorro. Eu poderia feliz e proveitosamente assentar-me e passar o resto de minha vida somente com Mário Ferreira dos Santos. |
| ↑20 | SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia Concreta. São Paulo: Editora Filocalia, 2020, p. 354. |
| ↑21 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55. |
| ↑22 | Tomo a lógica, enquanto aspecto modal, com implicação da ontologia filosófica de Herman Dooyeweerd. |
| ↑23 | Agnoia significa ignorância. Não uma ignorância pré-teórica, a agnoialogia equivale a douta ignorância de Nicolau de Cusa. |
| ↑24 | O professor Olavo disse: “Estudar lógica não torna ninguém mais inteligente. O que funciona é treinar o “instinto lógico” no uso da linguagem diária. Instinto lógico é o senso da coerência entre linguagem e realidade. Nenhum manual de lógica ensina isso, mas todas as grandes obras de literatura ensinam”. Disponível em: https://x.com/opropriolavo/status/1318964199742164993. Acesso em 19 de julho de 2025. |
| ↑25 | No meu livro (Ensaios teofilosóficos machadianos – Vol. 1), eu construí uma teoria carvalhiana que a batizei das doze letraduras principiais. A partir de Olavo, considero que só podemos dominar nosso idioma pela alta cultura literária brasileira. Em última instância, Olavo de Carvalho acertou à primeira quando disse que temos de formar nosso imaginário. |
| ↑26 | Todas as ciências, por possuir um discurso dialético (os outros discursos estão virtualmente latentes), são passíveis de serem atualizadas. Nenhuma ciência pode arrogar para si apoditicidade. Qualquer cientista que capte algo apodítico, já não faz mais ciência, mas entrou para o reino da filosofia. Muitos filósofos, antes de se tornarem tal, eram cientistas. |
| ↑27 | A filosofia assume um discurso analítico-apodítico. Todas as captações filosóficas são complementos no grande castelo filosófico. Em filosofia, não se atualizam verdades apodíticas, o que pode acontecer é encontrarmos novos filósofos que complementem o vero no quadrante, colocar um bloquinho no grande castelo para a filosofia ficar maior. Alguns filósofos modernos tentaram destruir o castelo, mas só tentaram. O GRANDE castelo das verdades filosóficas apodíticas durará para todo sempre – até o fim dos tempos. |
| ↑28, ↑31, ↑32, ↑33, ↑34 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.55. |
| ↑29 | O eu-outro são axiomas da filosofia quadrante. Há diálogo intenso com o Martin Buber. |
| ↑30 | O conceito predisponente foi desenvolvido pelo filósofo Mário Ferreira dos Santos. |
| ↑35 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.56. |
| ↑36 | WITTGENSTEIN, L. Tractatus logico-philosophicus… Op.cit., p.56. |