“Livros para quê? A vida é vivida pagando boletos, asfaltando estradas, e ganhando muito dinheiro com cursos sobre política, . Só temos a política. Esse é o momento. É isso ou a Venezuela. Vida intelectual é coisa de gente imatura, imediatista e mimada. Vá lá e faça melhor!“
– Pequena Burguesia Neocon
Caro leitor, é preciso que fique claro que o nosso artigo não pretende comentar sobre a politicagem banal do dia a dia, seja na esfera de cargos públicos ou de militância que a cerca. O que queremos é dar, ao nosso assinante, uma reflexão de alguns tópicos, muitas vezes suscitados no seu dia a dia, mas que lhe é negado um entendimento mais profundo e sério. Com isto, lembramos ao leitor que só podemos compreender um acontecimento político quando o subordinamos a teoria, que por sua vez, não pode estar distante do problema da sociedade. Para o leitor inexperiente essa frase, à primeira vista, pode causar espanto. Explique-se então o que queremos dizer com isto.
Voltemos um pouco ao passado. Estamos em meados do ano de 2009, onde o Professor [1] Usaremos sempre a inicial maiúscula para nos referir a nossos grandes professores, como forma de elucidar a diferença entre eles e os demais. e Filósofo Olavo de Carvalho começava a primeira aula do Curso Online de Filosofia (COF). É verdade que o Professor Olavo, há muito, já figurava no cenário cultural – com a trilogia de seu “A nova Era e Revolução Cultural”, “O Jardim das Aflições”, e “O Imbecil Coletivo”, nos anos de 1994, 1995 e 1996, respectivamente. Além disso, ele já era colunista do jornal “O Globo” e do “Diário do Comércio”. Porém, vamos usar essa cronologia do COF para simplificar nosso propósito, e delinear um mapa temporal.
Citemos então o Professor: “A situação social do estudante de filosofia no Brasil é calamitosa, e é por isso mesmo que apareceu este curso…. Eu queria que vocês tomassem, desde já, consciência de uma coisa extremamente importante, que vocês tem que meter nas suas cabeças: se houver uma cultura superior no Brasil, daqui vinte ou trinta anos, será devido a vocês, e exclusivamente a vocês.” [2]Carvalho, aula 01 do curso online de filosofia.
Portanto, podemos observar que a proposta era: a criação de um ambiente cultural fecundo, para que dali saíssem os novos líderes da nação brasileira, nos mais diversos campos culturais. Podemos dizer que, durante muitos anos, este propósito se cumpriu. Não devemos esquecer que era o ano em que o Lula terminava o seu segundo mandato, passando a faixa para a sua sucessora Dilma Rousseff. Era uma tentativa de revitalizar a cultura, mesmo num cenário político e cultural completamente hostil. A tentativa foi tão bem sucedida que, com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, no ano de 2018, a própria intelectualidade de esquerda [3]https://theintercept.com/2018/10/28/novo-brasil-esculpido-olavo-de-carvalho/ teve de produzir uma confissão – no qual aquele cenário só era possível graças ao Professor Olavo.
Não é para menos. De 2009 até a eleição de 2018, foram criados [4] Que fique claro, desde já, que o artigo em questão não dirige a sua crítica a essas figuras, a qual gozam de nosso mais sincero entusiasmo e admiração. institutos Católicos como o Centro Dom Bosco, o Instituto Santo Agostinho, a Sociedade Chesterton Brasil, a Minha Biblioteca Católica, o Obras Católicas, o Centro Hugo de São Vitor e tantos outros – que se não devem a sua inspiração diretamente ao Professor Olavo, o devem a bibliografia mencionada, veiculada e disponibilizada – , além das iniciativas culturais como Brasil Paralelo, o Senso incomum, a Vide Editorial, a Erealizações, a Sétimo Selo Editora, o Instituto Hugo de São Vitor, a Editora Ecclesiae, o Instituto Borborema, o Clube Rebolças, a página Contra os Acadêmicos, o Tradutores de Direita, sem contar a eclosão de grandes nomes como o Bene Barbosa, o Professor Rodrigo Gurgel, o Príncipe Dom Bertrand, o Príncipe Luiz Philippe de Orleans, e muitos outros.[5]Não iremos mencionar as inúmeras bibliografias disponibilizadas pelo Professor, e, consequentemente, a sua publicação no mercado editorial, pois teríamos de usar umas 100 páginas só para as … Continue reading
Foram estas, e outras, iniciativas que começaram – cada um em sua área – a levantar discussões sobre temas que, até então, eram censurados, omitidos ou deturpados, pela elite dominante. A partir daí, ninguém mais pode impedir que o seu João, a dona Josefa, pessoas simples do interior do país, pudessem ter acesso a instrução, a temas sociais, dos quais a burguesia elitista dominante (jornais, televisão, universidades, políticos, megacorporações…) excluíam o cidadão.
Isto porque, anteriormente, a cidadania era decidida por uma elite burguesa – fazendo com que o seu João acreditasse que ele era violento, incapaz, e que, portanto, não podia ter posse de arma; que a dona Josefa devia a educação das suas filhas ao movimento feminista radical , e que, portanto, estava tudo bem um currículo escolar com assuntos sexuais-infantis; que o cidadão tinha de agradecer por receber 300,00 de programas sociais, enquanto esta mesma elite burguesa-politica, ganhava um salario de mais de 30.000,00, pagos do bolso do povo, do trabalhador.
Foi a introdução desta iniciativa cultural que permitiu a teoria instruir, e orientar, a prática cidadã; permitiu que se corrigissem as visões deturpadas da elite burguesa dominante, abriu a possibilidade de mostrar que a cultura estava na sociedade – no mais simples cidadão, nas mais pequenas tradições, e que a vida comum era uma vida rica e cheia de frutos. Podemos nos perguntar o que aconteceu para que chegássemos a este ponto de decadência, qual seja: o domínio social da burguesia neocon – que conseguiu massacrar, através da política banal, a teoria.
Que fique claro que não versaremos aqui sobre a militância neocon – embora, é bem verdade, uma burguesia neocon só pode se tornar dominante com a existência de uma militância neocon. Queremos tratar do fenômeno que permitiu a destruição da teoria conservadora, a teoria de uma sociedade cultural, de uma alta cultura. Por que deve ser assim? Porque é bem claro que a militância neocon é o fenômeno clássico do brasileiro, analisado pelos gigantes Gilberto Freyre, João Camilo de Oliveira e Oliveira Lima. [6]E que serão tratados, à parte, por nós em outro momento oportuno. O brasileiro neocon é o típico brasileiro do espírito prático; o brasileiro que vai ao shopping, gasta 600,00 em um tênis, mas passa longe de pagar 50,00 em um livro; para esse brasileiro, o livro tem utilidade apenas para passar em concurso.
Ler não serve de nada, é apenas um sonho imaturo, ele pensa. A vida real, ele continua, é pagar boletos, amadurecer, ter um emprego, um bom salário, e, de preferência, um cargo público com estabilidade. Em dado momento, ele acorda para a vida política, e é aí que a burguesia neocon encontra a fertilidade de seu mercado. O intelectual neocon, o burguês neocon, é o cara que começou sua vida de estudos, mas, em certo momento, vê que há um mercado lucrativo em politizar a cultura. Vender livros mercadológicos, cursos de política, frases de efeito, lives em youtube, é um negócio de sucesso.
Falar bem de um governo – no qual a militância neocon deposita a sua alma, sua esperança – é a melhor maneira de ganhar domínio sobre essa massa, e, ao mesmo tempo, benesses desse governo. Neste cenário, um intelectual mediano é como o intelectual do salão das luzes da Revolução Francesa: embora de pouca capacidade intelectiva, sua narrativa é tão poderosa, tão feroz, tão apaixonada, que parecerá, para a massa, a Filosofia de Platão – mesmo que dele não se faça lá grandes exigências intelectuais ou espirituais. Quanto mais o intelectual venda sua alma, sua cultura, seus princípios, sua posição intelectual-conservadora, sua religião, sua história, para salvar o deus politico, mais ele prova, a massa, que quer livrar o Brasil do regime venezuelano.
Neste intento, dá cursos, ministra palestras, faz vídeos e lives, mostrando que teoria não funciona – e, claro, ganha muito dinheiro com isso. Ensina que livros, debates e alta cultura, são um sonho distante. “Temos de fazer a política do hoje, pois: A POLÍTICA É A ARTE DO POSSÍVEL!”. O burguês neocon não acredita em vida intelectual, porque para ele a vida se dá no boleto, e o boleto se dá na economia e política, não no debate ou na teoria. Só o debate político, de agora, de hoje, pode ajudar a combater o inimigo – ainda que esse inimigo tenha passado os últimos 100 anos estudando e teorizando sua atuação.
Peço desculpas ao leitor, mas terei que estender esse texto um pouco mais. Gostaria de mostrar um pouco do pensamento daqueles que são sempre citados, mas nunca lidos, para que fique claro a importância da teoria ser o guia de uma ação política, e que, longe de ser como falam, é urgente que se comece por um movimento intelectual antes de uma ação política. Vamos então falar um pouco sobre a Escola de Frankfurt. Porém, para que não se complique por demais este artigo, falaremos sobre tal assunto em nossa parte II – disponível exclusivamente para nossos assinantes.
References
↑1 | Usaremos sempre a inicial maiúscula para nos referir a nossos grandes professores, como forma de elucidar a diferença entre eles e os demais. |
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↑2 | Carvalho, aula 01 do curso online de filosofia. |
↑3 | https://theintercept.com/2018/10/28/novo-brasil-esculpido-olavo-de-carvalho/ |
↑4 | Que fique claro, desde já, que o artigo em questão não dirige a sua crítica a essas figuras, a qual gozam de nosso mais sincero entusiasmo e admiração. |
↑5 | Não iremos mencionar as inúmeras bibliografias disponibilizadas pelo Professor, e, consequentemente, a sua publicação no mercado editorial, pois teríamos de usar umas 100 páginas só para as catalogar. |
↑6 | E que serão tratados, à parte, por nós em outro momento oportuno. |