A secularização demasiada da vida tem solapado e banalizado quaisquer aspectos referentes ao âmbito espiritual. Para tudo – sejam os mais específicos assuntos -, há uma área científica especializada. Tudo é reduzido a um circuito fechado onde cada mecanismo de funcionamento tem sua devida “assistência técnica”.
As cabeças seculares acreditam-se tão intelectuais, e sabedoras de supremos conhecimentos, que, hoje em dia, acham inadequado e inapropriado falar de “espírito”, pois é uma entidade abstrata que não pode ser vista. Acreditam que, mesmo que se explore o tecido nervoso, por meio de um microscópio, jamais será encontrado algo como espírito no corpo, e então perguntam: “onde está o espírito?”. Mas, por que questionamos? Por que buscamos o conhecimento? Por que buscamos respostas? O que nos motiva a tudo isso? As razões que nos levam a estas questões podem ser vistas em microscópios?
São tangíveis, são corporais? Não, pois tratam-se de fenômenos mentais, ou seja, aquilo que se buscou em microscópios, já era condição pressuposta para a pergunta. A verdade é que a humanidade está embriagada em seu ego, vaidade e amor-próprio, ao ponto de piamente acreditar ser a espécie autótrofa, capaz de autoproduzir todas as suas demandas, e “fotossíntetizar” todas as suas necessidades. O homem secular quer se dessacralizar, ou seja: esvaziar-se de tudo que diz respeito a espiritualidade, religiões, crenças – acreditando que libertando-se de crendices de antepassados “purificar-se-ia”. Mas quer queira ou não, em sua natureza, conserva, e sempre conservará, vestígios do espírito, mesmo não tendo espiritualidade.
Na verdade, embora estejam sedentos, não vão ao encontro do rio, mas ao mar, bebendo, então, uma água salgada – na qual quanto mais bebem, mais sede sentem. A sede é a prova mais verdadeira da existência da água. Como poderia alguém sentir sede se não existisse água? A existência humana sempre foi além de si mesma, indicando um sentido. Mas, qual o sentido da vida? Pergunta essa já um tanto quanto banalizada, reduziram-na a um clichê cafona, parecendo não ter mais sentido perguntar pelo sentido da vida – virando, até mesmo, um escárnio. Mas, quer queiram ou não, admitindo-se ou não, o ser humano crê em um sentido. [1] E isso se dá até mesmo com um suicida, porque ele acredita haver sentido, não na vida, mas na morte, se não ele não se mataria. Sendo assim, ele precisa ver sentido no seu suicídio.
Já dizia Pascal: “Todos os homens procuram ser felizes; isso não tem exceção… É esse o motivo de todas as ações de todos os homens, inclusive dos que vão se enforcar…”. [2]PASCAL, Blaise. Pensamentos. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2005 Ateus convictos, como eu fui por muito tempo, ficam horrorizados e indignados com a ideia de um “ser superior”, de uma existência para além desta. Acreditam ser um escárnio, ofensa ao intelecto humano e, até, a dignidade humana, ter uma visão de mundo que não possa ser intelectualizada e racionalizada. Para mim, antes, como um ateu, fazer-me este questionamento, em si, já não teria sentido, pois uma espécie de niilismos de um nada existencial já teria pressuposto a exclusão inexorável de qualquer sentido. A pergunta: “qual o sentido da vida?” era como um daqueles questionamentos infantis do tipo: “De onde vêm os bebês?”.